1.9.10

Robô Goliardo

A noqueira Sueli Vasconcelos escavou uma postagem do Casa de 2007. Acho que vale à pena repetir a letra dessa poesia monumental do Belchior. Vai aí o texto na íntegra, escrito na época.

Em 1987, quando comecei a publicar, quadrinizei parte desta música de Belchior e Jorge Mello. Eu estava no maior baixo astral na época e fiz uma história que rendeu uns 60 quadros. A música é Rock-romance de um robô goliardo. Preparados pra letra? Vamos lá... (Vamo ler porque demorou um tempão pra eu copiar do encarte do LP).

Alô rapaziada! Alô, gente fina! Alô, moçada! Eu sei que vocês estão com a vida que pediram a Deus... e ele deu. Muito que bem! Por isso espero tudo de vocês.
Mas não confiem em mim: eu não existo! Sou apenas um personagem que diz isto.
E não me chame irresponsável. Para que levar a vida assim tão a serio? A vida é, mesmo, uma aventura da qual não sairemos vivos. Ah! Tudo já é outra viagem!
Abra com meu velho canivete seu jovem coração de lata; entre no barco eletrônico da emoção barata. Vamos dar um balanço cibernético nas horas!
Pulsars/quasars/buracos negros/astros/Guerra e Paz/amor nas super-estrelas.
Robô goliardo deste tempo, narro a minha vida começando pelo fim.
É bem melhor assim.
Vou contar pra vocês a vida que eu inventei pra mim.
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O som do alto-falante rolava e me dava um toque.
E Chuck Berry, berrando
em sua guitarra era um choque.
Cometas Halley passando,
astros no pó de Woodstock, cabeças, pedras rolantes,
Jim, Jimi, john, Janis Joplin;
E a moçada do subúrbio
cinemas, topetes, motos
Rock'n roll
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E digo mais: até parece que foi ontem! Tinha roubado o carro do meu pai, brigado com o cara do bairro vizinho por causa de uma garota. Estava saindo do chuveiro, novinho em folha- um artista diante do espelho! Pondo brilhantina no cabelo e mercúrio cromo num corte de gilete do meu rosto. Vesti o blusão de couro, liguei a motocicleta...

Queria sair voando pra pegar meu broto... Entrar na sessão das cinco, tomar um sorvete lá na lanchonete, dar um rolê por aí.
Ia pondo o pé na rua quando a minha velha saltou de lá, muito cheia de si, me chamando PLAYBOY! REBELDE! TRANSVIADO! Como se fosse dona do mundo. E foi logo dizendo:
-Pra você ver a vida como é! A gente cria um bicho desses, educa, dá do bom e do melhor, casa e comida, roupa lavada, amor, carinho, mesada... e esse aventureiro termina deixando a escola! Fugindo de casa! Maldizendo a família! Querendo ser cantor de rock!
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Caí na estrada tirana: (a juventude é um dom)
garotas, sonhos, mil transas, como dar bandeira é bom!
Olhando a cidade grande ,cheia de fúria e de som;
querendo ser uma estrela, de sexo, laser e neon...
Cidade grande é uma droga mas o roque dá o tom.
------------------------------------------------------------------------------------------------Qual é o preço de um homem? E eu? Pago quanto para ser feliz? Cidade-morena-boca-de-ouro-de-tolo... luminosos/fliperamas/ondas hertezianas/mil escrituras/canções- OUTROS SONS! vídeogames/novelas/televisão... informática-cibernética-política-eletrônica-acústica/grandes populações/revoluções...-------------------------------------------------------------------------------------------------Assaltantes/bêbados/abandonados/indios/nordestinos/retirantes/prostitutas/pivetes/punks/pobres/suicidas/solitários...(de onde eles vêm?) viciados/velhos/vagabundos......
Sacos de plástico, latas amassadas, copos de papel esquecidos depois dos jogos e das feras. Miseráveis! sempre sem pão e daqui a pouco sem circo. Coisa ante cuja visão dá vontade de morrer.
E a glória? E a honra de seres humanos que Deus criou e pôs um pouquinho só abaixo de seus anjos?
Mas esses senhores não querem nada! Não querem perder tempo com essa porcaria que se chama gente!
------------------------------------------------------------------------------------------------Eu não sou cachorro não, pra viver assim tão humilhado.
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São mil milhões de habitantes deste parque industrial: negros,mulheres, menores- filhos da crise geral- iguais pela mesma bomba que vai cair no quintal.
Ídolo e Deus dos esgotos a musa urbana me fez. Meu sucesso é saber disso e bater tudo pra vocês.
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É isso aí, rapaziada! É isso aí, gente fina! Talvez a gente pudesse dizer adeus de outro jeito. Mas eu sou um antropófágo urbano, um canibal delicado na selva da cidade. Mais dia menos dia... eu como você. E você como eu!
Ora, ora! Sempre houve um lugarzinho a mais para alguém debaixo dos meus lençois.


Um comentário:

Bulga disse...

Dê uma passada lá no bar do bulga Tem jorge Mello


abs