17.8.07

O Apanhador no Campo de Centeio



Desde minha adolescência eu ouvia falar de O Apanhador no Campo de Centeio, do escritor americano J.D. Salinger, mas nunca tive acesso a ele. Em 1989 fui pra Londrina (fazer o quê, não me lembro) - acho que montar uma exposição de cartuns na UEL, sei lá. Passei num sebo e quase caí de costas quando vi o livro de Jerome David Salinger, à preço de banana.

O Apanhador fez a cabeça de muita gente nos anos 40/50 e conta a história de Holden Caulfield, um garoto de 16 anos, de classe rica, inconformado e mentiroso que só ele, que reprova pela terceira vez em Internato particular e conceituado. Desta vez foi no Pencey, de onde ele cai fora e conta -em primeira pessoa- suas andanças que dura um dia e uma noite, até chegar em Nova Iorque, onde moram seus pais e Pheobe, a irmã de 10 anos.

"Se querem ouvir o que aconteceu, a primeira coisa que vão querer saber é onde nasci, como passei a porcaria da minha infância, o que meus pais faziam antes que eu nascesse, e toda essa lenga- lenga tipo David Copperfield. (...) Vou começar a contar o dia em que saí do Internato Pencey. Já devem ter ouvido falar nele, ou pelo menos visto os anúncios. Eles fazem propaganda em mais de mil revistas, mostrando sempre um sujeito bacana, a cavalo, saltando uma cerca. Parece até que lá no Pencey a gente passava o tempo todo jogando polo. Pois nunca vi um cavalo por lá, nem mesmo pra amostra".
"Sou o maior mentiroso do mundo. É bárbaro. Se vou até a esquina comprar uma revista e alguém me pergunta onde que estou indo, sou capaz de dizer que vou a uma ópera".
" (...) achei que ia pegar uma pneumonia e morrer. Fiquei imaginando milhões de chatos indo ao meu enterro e tudo. Meu avô de Detroit, aquele que fica lendo alto os nomes das ruas quando a gente anda numa porcaria dum ônibus com ele, e minhas tias- tenho umas 50 tias- e todos os nojentos dos meus primos. A tropa toda ia estar lá. Estavam todos quando o Allie [irmão de Caulfield] morreu. Me deu uma pena danada de meu pai e de minha mãe. Só tinha uma coisa boa, era saber que ela não ia deixar a Phoebe assistir a droga do meu enterro porque é muito criança.
Ai pensei na cambada toda me metendo numa droga de cemitério, com meu nome num túmulo e tudo. Cercado de gente morta. Puxa, depois que a gente morre eles fazem o diabo com a gente.
Quando faz bom tempo, meus pais vão ao cemitério e espetam um punhado de flores no túmulo do Allie. (...) não é tão ruim quando faz sol, mas duas vezes quando estávamos lá dentro começou a chover. Foi horroroso. Choveu na porcaria do túmulo dele, e choveu na grama em cima da barriga dele. Chovia por todo lado. O pessoal todo que estava de visita saiu correndo para os carros. Foi isso que me deixou doido. Todo mundo podia correr pra dentro dos carros, ligar o rádio e tudo e ir jantar num lugar bacana- todo mundo menos o Allie".
A parte em que o leitor fica sabendo o porquê do título da obra é interessante. Depois de chegar em Nova Iorque após ter sido reprovado, Holden leva uma chamada da irmãzinha, que, com seus 1o anos, tem bem mais juízo que ele.


"- Papai vai te matar. Vai te matar.
- Você sabe o que eu queria ser?- perguntei a ela- Se pudesse fazer a merda da escolha?-
- O que? Pára de dizer nome feio.- Sabe aquela cantiga "Se alguém agarra alguém atravesando o campo de centeio? Eu queri...
-A cantiga é " Se alguém encontra alguém atravessando o campo de centeio". É dum poema de Robert Burns.
- Pensei que era " Se alguém agarra alguém"- falei. Seja lá como for, fico imaginado uma porção de garotinhos brincando de alguma coisa num baita campo de centeio e tudo. Milhares de garotinhos, e ninguém por perto. E eu fico na beirada de um precipício maluco. Sabe o que eu tenho que fazer? Tenho que agarrar todo mundo que vai cair no abismo.
Quer dizer, se um deles começar a correr sem olhar onde está indo, eu tenho aparecer de algum canto e agarrar o garoto. Só isso que eu ia fazer o dia todo. Ia ser só o apanhador no campo de centeio e tudo. Sei que é maluquice, mas é a única coisa que eu queria fazer. Sei que é maluquice."

Jerome David Salinger, o autor, é uma figura estranha. Nascido em 1919, desde sempre foi avesso à imprensa ou outras formas de divulgação da sua figura, tornando-se paranoicamente recluso. Ainda na época do lançamento de O Apanhador... , fez o seu editor prometer que não lhe enviaria quaisquer críticas que fossem publicadas sobre o livro. Reclamou também que a sua foto na contra-capa estaria muito grande. Solicitou que não fosse feita qualquer publicidade do livro aludindo à sua pessoa, alegando que não queria correr o risco de acreditar no que leria.

Salinger também publicou Nine Stories; Fanny and Zooey e Raise High the Roof Beam, Carpenters. Esse último eu também possuo e foi lançado pela Editora Brasiliense nos anos 80 com o o título de "Pra cima com a Viga, Moçada", bem melhor do que "Carpinteiros, Levantem Bem Alto a Cumeeira"(agh) lançado pela Companhia das Letras em 2001.

É mau ficar recomendado leitura para os outros, até porque o ato ler e o gosto pelo estilo é muito subjetivo. Mas, de qualquer forma, vai: leiam que é satisfação garantida.
(Tem no Submarino. Mas eu achei meio carinho: R$33,50). Talvez seja melhor garimpar num sebo) .

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